segunda-feira, 16 de julho de 2018

KOBUDÔ: A TRADIÇÃO DAS ARMAS DE OKINAWA










O Kobudô (古武道?), também conhecido Ryukyu Kobudô, ou “caminho das antigas artes marciais” é uma disciplina surgida na ilha de Okinawa que inclui o aprendizado de diferentes armas, como Sai, Nunchaku, Tonfa, Bô, Eku e Kama, instrumentos de trabalho usados na agricultura transformados depois em armas para a defesa dos trabalhadores conta ataques de piratas. Com a proibição da fabricação, comércio, porte e uso de espadas imposta pelo governo local à população, essa foi a maneira encontrada pelos camponeses e pescadores da ilha para a sua proteção. É impossível sabermos o período exato em que o Kobudô surgiu, porque os arquivos históricos de Okinawa foram destruídos por bombardeios norte-americanos durante a II Guerra Mundial, mas é possível que tenha ocorrido entre os séculos XV e XVI, época de expansão do comércio da ilha. Em 1609, Okinawa foi invadida pelo clã de Satsuma, ligado ao xogum Tokugawa, que reforçou o banimento do uso de armas de metal, o que contribuiu também para o desenvolvimento de outra arte marcial, o Karatê, a “arte das mãos vazias”, popularizado mais tarde no arquipélago japonês pelo sensei Funakoshi. O Kobudô é considerado por alguns pesquisadores como precursor do Karatê e vários estilos dessa arte incluem o treinamento nessa disciplina de armas. No Brasil, a arte do Kobudô foi introduzida pelo sensei Shikan Akamine, que desembarcou no país em 1958.

Armas tradicionais usadas no Kobudô:

SAI           

Adaga de três pontas, semelhante a um pequeno tridente, derivado de uma ferramenta agrícola usada para a semeadura nos campos (segundo outra versão, usada para a construção de cercas). Arma de difícil manuseio, pode ser utilizada para quebrar a espada de um samurai, travando-a nas hastes menores, atravessar armaduras, perfurar o adversário com as pontas ou ainda como arma de arremesso.

NUNCHAKU

Formado por dois pedaços de madeira colocados nas pontas de uma corrente ou corda, é usada para golpear fortemente o adversário, desarmá-lo, imobilizar uma parte de seu corpo, entre outras ações. É usado também em outras artes marciais, como o Kung Fu chinês e o Tae Kwon Dô coreano.

TONFA

É um tipo de cassetete utilizado ainda hoje por forças policiais em vários países do mundo, inclusive o Brasil.

BO
É o bastão longo japonês, com cerca de 1,80m, utilizado também no Bojutsu. Em sua origem, era usado como instrumento para se carregar baldes presos em cada ponta. O bô é uma arma poderosa, de alto poder de impacto, capaz de ser utilizado com eficiência mesmo contra um adversário armado com uma espada.

EKU

Remo utilizado em canoas pelos pescadores de Okinawa, era empregado sobretudo em combates realizados na praia, inclusive para jogar areia no rosto do adversário. Um pouco menor do que o bô em comprimento, suas extremidades podiam infligir danos sérios ao oponente.

KAMA

Pequena foice usada aos pares ou sozinha, era usada no trabalho agrícola, especialmente nas plantações de cereais.


sábado, 14 de julho de 2018

O CAMINHO DA NAGUINATA





A naguinata (長刀・薙刀) é uma arma japonesa formada por uma haste de madeira com uma lâmina curva em uma das pontas, semelhante à alabarda europeia. O comprimento varia conforme o estilo e a escola, mas em geral a arma tem entre 2m e 2,50m, sendo que apenas a lâmina de aço, que é removível, tem de 30cm a 60cm. A naguinata surgiu, possivelmente, no Período Heian (794 d.C – 1185 d. C) e foi muito usada pelas onna-bugeisha, mulheres guerreiras das famílias aristocráticas, e pelos sohei, monges budistas, mas também por soldados de infantaria, ou ashigaru. Diversos estilos de bujutsu (artes da guerra) incorporaram técnicas de combate com a naguinata ao lado das artes tradicionais da espada, lança e arco e flecha, como é o caso do Suio-ryu, Katori Shinto-ryu e Yoshin-ryu e o uso da alabarda foi comum entre as esposas dos samurais, para a defesa de seus lares em períodos de guerra. Entre o final do Período Tokugawa e a Restauração Meiji, quando começa a modernização do Japão, surgiu uma nova arte marcial a partir da prática com essa arma, a Naguinata-do 薙刀道 ("caminho da naguinata"), que foi incorporada ao currículo escolar de educação física para as meninas no Período Showa (1926-1989). Os movimentos com a alabarda japonesa incluem cortes e defesas em todas as direções, com muita energia, ritmo e beleza. Conforme escrevem Howard Reid e Michael Croucher no livro O caminho do guerreiro: “Durante o Período Edo (...), realizaram-se as primeiras experiências de competição. Para fins de competição, a lâmina da alabarda foi substituída por duas peças de bambu com uma ponta de couro, o que tornava a extremidade funcional da arma muito semelhante à espada de bambu ou shinái. Num dos usos populares que se dava a essa arma leve, ela era usada por uma mulher em luta contra um homem armado da espada de bambu shinái. Nessas ocasiões, usavam-se trajes de proteção. A alabarda foi proibida junto com todas as outras armas depois da Segunda Guerra Mundial, mas o naguinata-dô esportivo foi um dos primeiros sistemas de uso de armas a ressurgir depois de suspensa a proibição dos aliados. Em sua nova forma, o caminho ficou muito mais voltado para as competições esportivas e ainda mais regrado do que era antes. Uma federação nacional foi constituída em 1956 e, hoje em dia, mais de dois milhões de mulheres praticam a forma esportiva, embora sejam poucas as que pratiquem as formas clássicas e mais austeras da disciplina.”  


domingo, 8 de julho de 2018

KABUTO, O CAPACETE TRADICIONAL SAMURAI


A ARMADURA SAMURAI







Os samurais lutaram no período feudal japonês contra exércitos de países vizinhos, como a China e a Coreia, e também se envolveram em diversos conflitos entre os diferentes clãs japoneses, até a unificação do país no Período Tokugawa, no século XVII, que deu início a um longo período de paz. A armadura utilizada pelos samurais era essencial para a proteção dos guerreiros no campo de batalha, numa época em que as principais armas utilizadas eram a espada, a lança e o arco e flecha, até a introdução das armas de fogo pelos portugueses, no Período Namban, no século XVI, fato que irá modificar completamente as formas de luta dos samurais. A armadura tradicional japonesa pode ter evoluído a partir das antigas armaduras chinesas, mas adquiriu características próprias. Durante o Período Heian (794-1185), os fabricantes de armaduras japonesas usaram como matérias-primas o couro, o ferro, a laca e até mesmo a seda, de modo que a proteção fosse ao mesmo tempo resistente, leve e confortável, em comparação com as pesadas armaduras de ferro europeias, e também adaptada ao severo clima japonês. O samurai deveria ter mobilidade suficiente para montar a cavalo, disparar o arco e flecha e eventualmente lutar de pé, com espada ou lança, logo, a armadura não poderia dificultar os seus movimentos. Conforme escreve Thomas D. Conlan, "no Japão, a armadura dos samurais era normalmente conhecida como 'grande armadura' (oyoroi). Tinha um formato de caixa, com mangas (sode) proeminentes. A armadura era feita de milhares de pequenas placas, chamadas sane, feitas de madeira e revestidas de laca. Frequentemente, na região peitoral, as sane de madeira laqueada eram reforçadas com placas de metal, para evitar disparos mortais no peito. (...) O elmo (kabuto) era geralmente feito de ferro, com abas de sane protegendo os lados e a parte de trás. do pescoço  (...) Havia um pequeno visor na parte da frente do elmo. Os elmos também eram pesados, tanto que os samurais proeminentes não os usavam até irem para a batalha. (...) Acreditava-se que os dois grandes chifres, os kuwagata, proporciovam poderes místicos a seus portadores".         

sábado, 7 de julho de 2018

KENDÔ: A UNIÃO ENTRE O CORPO, A MENTE E A ESPADA







O Kendo (em japonês剣道caminho da espada) é uma arte marcial japonesa derivada das técnicas de combate com a espada do Japão medieval, codificadas nos vários estilos de Kenjutsu.  Ao contrário da arte guerreira, o Kendô, em sua origem, estava voltado ao caminho espiritual, sob influência do zen-budismo. Entre seus princípios, estão o cultivo da mente e da paz interior pela prática da espada, o fortalecimento da saúde, o estímulo à cortesia e à honra e o cultivo de valores como a sinceridade, o respeito e o amor ao próximo, valores estabelecidos em 1975 pela All Japan Kendo Federation. Para atingir esses objetivos, o praticante deve conquistar a união entre o corpo, a mente e a espada. O Kendo foi desenvolvido a partir do Período Tokugawa, em que o Japão viveu um longo período de paz. Os samurais não eram mais requisitados para as batalhas, e passaram a cumprir funções burocráticas e administrativas, além de se dedicarem a artes como a pintura (sumiê), caligrafia (shodô), cerimônia do chá e teatro nô. As antigas técnicas guerreiras também foram modificadas, sendo praticadas, agora, como disciplinas para a realização espiritual. É neste contexto que, no século XVIII, Yamada Heisaemon e Naganuma Shiro da escola Jikishinkage-ryu e Nakanishi Chuzo da escola Itto-ryu,introduziram uma espada feita com tiras de bambu (shinái), nos treinos, em substituição à espada de madeira (bokutô) ou de aço (kataná) utilizadas em outras modalidades da esgrima japonesa. Esta é a gênese do Kendo, que até hoje utiliza a shinái, e também um tipo particular de armadura, para a proteção corporal. Durante o período da Restauração Meiji, o Kendô, assim como o Judô, foi introduzido nas escolas e universidades japonesas como atividade de educação física, obtendo grande popularidade. Após a derrota do Japão na II Guerra Mundial, o Kendô foi proibido pelas autoridades de ocupação norte-americanas, assim como outras artes marciais (com exceção do Karatê), sendo reabilitado a partir de 1952. Desde então, essa arte tem se expandido pelo Ocidente, ganhando numerosos adeptos. Atualmente, o Kendo é praticado, sobretudo, como uma modalidade esportiva de competição, em que o objetivo é conquistar pontos, o que acontece quando um praticante acerta com a espada o topo da cabeça, a garganta, os ombros, o centro e os lados do peito e a parte de cima das mãos e dos pulsos do adversário (partes do corpo que estariam normalmente protegidas pela armadura usada pelos samurais). No Brasil, o Kendo foi introduzido em 1908, sendo praticado, na época, sobretudo pelos imigrantes japoneses. Em 1933, surgiu a primeira associação brasileira de Judô e Kendo, a Hakoku Ju-Ken Do Ren-Mei. Nesta época, destacam-se os mestres Eiji Kikuchi Sensei, Ryunosuke Murakami Sensei e Kobayashi Sensei. Em 1959, acontece a fundação da Associação Brasileira de Kendo (Zen Haku Kendo Ren-Mei, em japonês). Em São Paulo, os primeiros treinamentos aconteceram em um dos primeiros clubes fundados pela comunidade nipo-brasileira, a Associação Cultural e Esportiva Piratininga (ACEP), que até hoje leciona essa modalidade, e também o Iaidô,  realizando eventos oficiais, apresentações, campeonatos e exames de graduação no Brasil.

Entre diversos mestres e escolas de Kendo podemos citar:
·         Ono-ha Itto-ryū – Kagehisa;
·         Shintō Munen-ryū – Watanabe Noboru, Shibae Umpachiro, Negishi Shigoro;
·         Musashi-ryū – Mihashi Kanichiro;
·         Jikishin Kage-ryū – Tokuno Kanshiro, Abe Morie;
·         Kyoshin Mechi-ryū – Sakabe Daisaku.


sexta-feira, 6 de julho de 2018

O CAMINHO DO ARCO E FLECHA








No período medieval japonês, as principais armas empregadas nos campos de batalha eram as lanças e os arcos,  utilizados por guerreiros montados em cavalos, enquanto as espadas eram usadas em combates a curta distância. Os samurais, portanto, recebiam treinamento no manuseio de vários tipos de armas, adequadas a diferentes situações, além das técnicas de lutas corpo a corpo, como o Jujutsu. A arte de combate com o arco e flecha, ou Kyujutsu, utilizava arcos longos, que mediam até dois metros de comprimento. “Apesar de serem compridos, eles podiam ser usados enquanto se cavalgava, uma vez que eram segurados no meio, porém mais perto da extremidade de baixo”, diz Thomas D. Conlan, no livro Armas e técnicas de luta dos guerreiros samurais. Conforme escreve o autor norte-americano, “os arcos mais antigos e mais simples que ainda sobrevivem eram feitos de galhos flexíveis, como brotos ou ripas retiradas de pedaços de madeira. Mais tarde, em arcos compostos, nos quais se usava cola feita de entranhas de cervo, a parte interna do arco era feita de bambu (...). As flechas também tinham haste de bambu, de três anos de idade. As pontas das flechas eram feitas de ferro ou aço, e tinham uma longa haste que se encaixava no bambu oco. Uma variedade de penas de aves era usada para ajudar as flechas a voarem longe e com precisão – a maioria delas sendo retirada de aves de rapina.(...) Os samurais levavam consigo algumas flechas especiais com seus nomes gravados, e usavam-nas ao mirar em oponentes de elevada patente, o que lhes permitia receber crédito por essa morte”.

Com a utilização das modernas armas de fogo, as formas de luta dos guerreiros samurais foram se modificando, até se tornarem já anacrônicas, em meados do século XIX, quando os canhões e metralhadoras passaram a ser os reis e rainhas dos campos de batalha. As antigas artes marciais foram então reformuladas,  tendo como objetivo não mais matar oponentes na guerra, mas cultivar a espiritualidade, a paz interior, a elegância, o refinamento artístico, a saúde e a longevidade, sem abrirem mão de sua eficácia. É neste contexto que o Kyujutsu (técnica ou arte do arco) transforma-se em Kyudo (caminho do arco), com forte influência zen-budista, como Eugen Herrigel relata no livro A arte cavalheiresca do arqueiro zen.

No que consiste o Kyudo? Segundo Howard Reid e Michael Croucher, no livro O caminho do guerreiro, “nesta prática altamente refinada, todo o desejo de atingir o alvo durante os atos de estirar o arco, mirar e disparar a flecha é substituído pela concentração na harmonização perfeita da respiração, do pensamento e da ação. O objetivo confesso do praticante de Kyudo é o de criar um elo entre o seu espírito e o alvo no momento do tiro. Atingir o alvo é um detalhe de importância secundária; o que importa de fato é que os movimentos preparatórios, como os de encaixar a flecha na corda do arco, levantar o arco e estirá-lo, sejam todos realizados segundo a forma perfeita. Cada movimento deve ser acompanhado pela respiração harmonizada e pela concentração mental, técnicas cujo desenvolvimento leva anos. No Japão antigo, o arco era considerado um objeto de boa fortuna, e o disparo de flechas com pontas ocas que assoviam pelo ar ainda marca o início de muitos rituais importantes da religião xintoísta”. 

segunda-feira, 2 de julho de 2018

IAI, A ARTE DE SACAR A ESPADA











Iaijutsu (居合術) é uma modalidade da esgrima japonesa que consiste em sacar a espada (batô), realizar cortes (kiri), limpar a lâmina (tiburi) e guardá-la na bainha (notô). Todos os katás são individuais e o praticante utiliza a lâmina de aço sem fio (iaitô) e calças largas pretas ou brancas (hakamá) sobre o quimono. Parte das técnicas são realizadas a partir da posição sentada. Conforme Luiz Kobayashi, no livro Peregrinos do Sol – A Arte da Espada Samurai, as técnicas de Iaijutsu “foram desenvolvidas para o campo de batalha, quando uma lança se quebrava e o guerreiro precisava sacar rapidamente a espada para não dar oportunidade de ataque ao oponente.  (...) A luta de um mestre de iai consistia basicamente em se aproximar ao máximo do oponente, sacando a espada somente no último momento”. O Iaijutsu tem numerosos estilos e modificou-se ao longo do tempo, dando origem ao Iaidô (居合道), que manteve os movimentos marciais, porém, com foco nos aspectos meditativos, com influência do zen-budismo. Segundo Howard Reid e Michael Croucher, no livro O Caminho do Guerreiro, “O Iaidô, ou ‘caminho do desembainhar da espada’, desenvolveu-se a partir da arte marcial Iaijutsu, ‘a arte de desembainhar a espada’. Seus movimentos se tornaram muito mais lentos (...). No iaidô, o praticante passa muito tempo procurando a postura e o equilíbrio perfeitos. A posição agachada, originalmente usada para ataques noturnos, é empregada com frequência; mas, quando chega o momento de desembainhar a espada, o espadachim concentra-se na realização de um movimento lento e homogêneo. Depois, descreve com a espada movimentos de curvatura perfeita, limpa meticulosamente a lâmina e a devolve à bainha (...). Quando executado com perfeição, o Iaidô é feito de movimentos belíssimos, como se fosse uma espécie de dança com a espada”.




domingo, 1 de julho de 2018

KENBU, A ARTE ESPIRITUAL DA ESPADA








Kenbu é uma das modalidades da esgrima japonesa, em que os praticantes utilizam a espada de aço sem corte (iaitô), calças largas pretas (hakamá) e meias pretas ou brancas (tabi) que faziam parte do vestuário dos samurais. O Kenbu é uma arte espiritual, meditativa, que valoriza a etiqueta, o respeito, a beleza estética e o desenvolvimento ético do ser humano, embora os seus movimentos sejam marciais. Um estilo de Kenbu desenvolvido pelo shihan Hiroyuki Aoki, denominado Kenbu Tenshin-ryu (a palavra Tenshin significa “verdade celestial” e ryu, “escola”) é praticado no Brasil desde 2018, ministrado pelo sensei Ruben Espinoza. Entre os princípios desta arte estão os seguintes: a) ser natural; b) relaxar e tornar-se um com o katá; c) unificar o próprio corpo; d) unificar-se com o próximo; e) unificar-se mutuamente com o katá, o parceiro e com o espaço da prática; f) tornar a mente livre; g) tornar-se vazio (no sentido taoísta e zen-budista, em que o vazio é o absoluto, a origem da vida e do universo); e h) tornar-se saudável. A instituição internacional responsável pela divulgação e normatização dessa arte é a Tenshinkai, localizada em Tóquio.

NA FOTO: shihan Wilson Motizuki, um dos principais divulgadores do Kenbu no Brasil.