sexta-feira, 14 de setembro de 2018

KENJUTSU, A ARTE DA ESPADA SAMURAI



O Kenjutsu, a arte da espada samurai, nasceu no período medieval japonês, tendo se desenvolvido a partir do Período Muromachi (séculos XV e XVI), quando surgiram os principais estilos dessa arte, voltada ao emprego nos campos de batalha. A espada utilizada pelos guerreiros japoneses, conhecidos como samurais, era a kataná, lâmina de aço curva surgida no Período Heian (794-1185), levada na cintura ao lado de uma espada menor, a kodachi. O combate com a espada era usado sobretudo nas lutas contra adversários localizados a curta distância, apoiando a ação da cavalaria, dos arqueiros e dos soldados de infantaria armados com lanças. As táticas e estratégias militares, as armas e equipamentos de proteção desenvolvidos nos feudos japoneses eram essenciais numa época em que o Japão esteve envolvido em conflitos entre os senhores da guerra locais e contra países vizinhos. Apesar do caráter guerreiro da arte da espada, ela estava relacionada com um rigoroso código de ética, chamado bushidô (“o caminho do guerreiro”), influenciado por ideias filosóficas de Confúcio e do taoísmo chinês. O samurai não era um simples soldado, mas um guerreiro refinado, que dedicava sua vida à defesa de seu mestre e dos valores e princípios de uma sociedade aristocrática em que a etiqueta, a beleza e a busca da perfeição estavam presentes em todos os campos da vida social. Com a unificação do país pelo xogum Ieyasu Tokugawa, no século XVII, o Japão conheceu um período prolongado de paz e a classe dos guerreiros ingressou na administração pública. As artes de combate foram então reformuladas, tendo como objetivos, agora, não apenas matar adversários na guerra, mas promover a paz interior, a realização espiritual, a preservação da saúde e da energia interna e estimular virtudes como a honestidade, a justiça, a lealdade, o respeito, a honra, a coragem e a compaixão. O bujutsu, ou artes da guerra, transformou-se em budô, artes da paz, da harmonia, do equilíbrio e da espiritualidade. Esse foi o espírito que animou as diversas artes tradicionais praticadas pela aristocracia japonesa, como a caligrafia, poesia, pintura, cerimônia do chá ou teatro nô, influenciadas pela filosofia zen-budista, seguida pelos samurais. A combinação da prática marcial com o da literatura e outras artes ficou conhecido como “o caminho combinado da caneta e da espada”. O Kenjutsu tornou-se uma arte espiritual e meditativa, porém, sem perder o seu caráter guerreiro e a sua eficiência. O ensino da arte passou a ser realizado em dojos, sob os cuidados de um mestre, ou sensei, por meio do ensino de diversas técnicas, ou katás, que são movimentos de ataque e defesa com a espada, realizados em duplas – um aluno (tori) realiza o ataque com a espada, e outro aluno (ukê) realiza a defesa, em diferentes sequências de movimentos. Em geral, usa-se a espada de madeira, ou bokutô, ao contrário de outras artes da esgrima japonesa, que utilizam a espada de bambu, ou shinái, ideal para competições esportivas, como acontece no Kendô, ou a espada de aço sem corte, a Iaitô, utilizada em artes de saque e guarda da espada, como o Iaijutsu e o Iaidô. Todas essas artes provêm do amplo repertório das formas de utilização da espada pelos guerreiros samurais, mas foram reformuladas para a prática nos tempos modernos. Além do treino dos katás, que são diferentes nas várias escolas, há exercícios preparatórios, conhecidos como kihons, que têm como finalidade exercitar a flexibilidade, o relaxamento, a leveza, a agilidade, e sobretudo o trabalho com a energia interna, ou ki, com os músculos brancos, pouco estimulados em outras formas de prática corporal, e sobretudo o treino com a cintura, ou koshi, base de todas as técnicas de Kenjutsu e de outras formas de artes marciais japonesas, como o Aikidô. Há centenas de estilos dessa arte, sendo que muitos deles se perderam, após a II Guerra Mundial. No Brasil, a primeira arte marcial com a espada praticada no país foi o Kendô, um esporte de competição que valoriza a velocidade, a força e a marcação de pontos, que acontece quando um espadachim acerta a cabeça, o antebraço ou outro ponto do corpo do adversário. Essa arte, praticada com equipamentos de proteção corporal, inspirados na armadura samurai, segue regras específicas voltadas para a participação em campeonatos e demonstrações esportivas. O Kenjutsu, que chegou mais tarde ao país, não é um esporte: mantém o caráter marcial, por isso mesmo não participa de campeonatos, nem possui um sistema de graduação desde a faixa branca até a faixa preta, como acontece no Judô ou no Karatê. Seus praticantes utilizam o dogui (quimono) e o obi (faixa) na cor branca, que no Japão é a cor da morte – neste caso, não a morte física, mas a morte de um antigo eu para o nascimento de um outro eu, mais sensível, receptivo, forte e saudável.  Os objetivos do Kenjutsu na época atual, segundo o sensei Ruben Espinoza, que ensina o estilo Hiramatsu-ryu em São Paulo, são os seguintes: estimular a capacidade mental de concentração, atenção, percepção, tomada de decisões, respeito e disciplina dos praticantes, através do treino dos katás; aumentar a capacidade física de coordenação motora, reflexos, velocidade, força, precisão e resistência; promover a saúde física, mental e espiritual; e resgatar a arte da espada samurai antiga, trazendo inovações nos treinos com influência das artes corporais modernas. 

P.S.: O Kenjutsu Hiramatsu-ryu é uma arte marcial espiritual de meditação em movimento que ajuda a desenvolver o espírito do guerreiro interior através da arte, sem perder a eficiência técnica da arte marcial samurai. O estilo foi trazido ao Brasil por Yamato Hiramatsu, que estudou diversos estilos antigos, como o Shinkage-ryu, Tamiya-ryu e Shinkenjutsu.